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terça-feira, 21 de agosto de 2012

Ghost Writer


A vida não era fácil no escritório em Guarulhos. Basílio fazia das tripas o coração, mas promoções e aumento de salário eram como cabeça de bacalhau. Distraía-se entre riscos e rabiscos que chamava de contos. Montou um blog onde, anônimo, relatava as agruras da vida.

Um dia, na Internet, viu seu texto reproduzido na íntegra, porém, com crédito a um escritor famoso e já falecido. Achou graça e refletiu: talvez houvesse futuro na literatura. Passou a escrever com seu nome e a cabeça repleta de sonhos. 
Dali uma semana foi procurado pelos representantes do falecido autor. A proposta: escrever quatro livros, sob contrato sigiloso, para que fossem lançados como obras póstumas. A grana era alta, mas o orgulho falou mais alto. Recusou.
No outro dia, o dono da empresa o chamou para um particular. Doutor Mário Bastos pediu que reconsiderasse. Os herdeiros do autor eram amigos próximos, gente de bem etc. A resposta, mais uma vez, foi “não”. A ousadia custou-lhe o emprego, sem direito a receber um único tostão.

Com a bile transbordante, trancou-se por dois meses. Saiu de casa com três livros prontos, verdadeiras obras de arte dignas de um Nobel. Bateu à porta das editoras e ouviu ofertas enviesadas. Não tinham interesse, porém, conheciam pessoas que adorariam “comprar” a autoria dos livros. Amargurado, decidiu que se tratava de questão de honra. Juntou as últimas economias, pediu uma gaita  para o cunhado e bancou a xérox e encadernação.

No boca-a-boca, as histórias caíram no gosto do populacho. O dinheiro que entrava era investido na produção de novos exemplares que se esgotavam rapidamente. Havia vendido mais de 50 mil cópias quando chegou a intimação. Basílio era acusado de plágio. Os herdeiros alegavam que o avô, antes de morrer, havia ditado aquelas histórias inéditas. A Justiça foi célere em condenar Basílio, que perdeu, até mesmo, o teto sob o qual vivia.

Nas ruas, descobriu que a pedra mascarava a fome e dava alívio rápido. Mas, ali, no centrão, os agentes da Lei botavam para quebrar. O comércio local patrocinava a operação limpeza. Sangue frio, capuzes e armas de numeração raspada. Numa quinta-feira, contabilizaram treze mortos. Entre eles, Basílio.

Ninguém reparou, mas o jornal que cobria o cadáver trazia a manchete “Obra póstuma é vencedora do Prêmio Jabuti”. Na foto, um velho conhecido sorria.

Por: Voltaire de Abreu

3 comentários:

  1. Mundo editorial do cão. Quantos talentos são tolhidos nessa idade média midiática que vivemos... Mundo de CASTAS, com nobres de MERDA!

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  2. Agora chega!!! Che-ga!!!Entenderam??Saibam que sou mecenas da literatura e financio muitas obras de autores consagrados.Muito me admira agora, a essa altura do campeonato,ver meu nome envolvido em histórias sórdidas desse blogue de patifes!
    Me aguardem!!!Ah, me aguardem garotos!!!!!!!

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