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segunda-feira, 25 de junho de 2012

Mais uma família brasileira



Mauro Agnaldo, 46 anos, casado, pai de cinco filhos, gordo e com costeletas, um típico brasileiro, que mata um leão por dia para garantir o sustento da família. Modesto até demais, vivia sem nenhum tipo de luxo, e colocava nada mais do que o necessário dentro de casa. O pão de cada dia, duro e amanhecido, provinha de seu minguado ordenado de policial civil, há mais de 30 anos.

Para garantir um brinquedo a mais aqui, ou um vestido do brechó para a esposa acolá, Mauro Agnaldo fazia bico em outros três trabalhos: vigia de bingo aos sábados, segurança de prostíbulo aos domingos e, quinzenalmente, fazia “segurança vip” para um filho de prefeito que dava as caras nas festas da cidade.

Marco Agnaldo, Marcio Agnaldo, Mario Agnaldo e Mastor Agnaldo eram os quatro rebentos a disputar o dinheiro e a atenção escassos do civil que não descansava nunca. “Teu pai trabalha demais, mas isso é pro nosso bem”, comentava Soleuza, enquanto apertava a mama para esguichar leite na boca faminta de um dos filhos.

Há tempos Mauro Agnaldo não ia às vias de fato com Soleuza. O cansaço e o esgotamento mental eram os grandes vilões, mas tudo valia a pena para “deixar a família querida feliz”, segundo as palavras do próprio Mauro.

Crente convicta, Soleuza freqüentava às reuniões da igreja semanalmente. Num dos encontros, resolveu fazer um pedido especial ao divino: Ó senhor, coloque uma luz em nossa vida. Esse pão que o diabo amassou que estamos comendo está muito amargo, ajuda tua serva.

E no dia seguinte, a luz veio. No pequeno banheiro de casa, desentupindo a privada, uma fresta de sol passou pelo buraco do teto. E, como num passe de mágica, iluminou diretamente o bolso da camisa de Mauro Agnaldo, pendurada atrás do box improvisado com lona de caminhão. Viu um envelope grande, branco, se surpreendeu: Conta da TV a cabo. Nete, 580 canais para sua diversão.

Aos poucos, o senhor revelou a dura verdade à Soleuza. Mauro Agnaldo tinha um só emprego, e dos bons, era fiscal da Receita Federal, e tirava, por baixo, uns trinta mil reais mensais. Nunca teve outros empregos, mas sim, diversas mulheres. Colocava o suficiente de tempo e dinheiro em casa, e gastava o resto com bebidas, festas, badalações.

Depois de dois meses, já com o quebra-cabeça completo montado, Soleuza resolve contar a verdade a Mauro Agnaldo, que assumiu tudo e respondeu, entre lágrimas: - Pois é, esse sou eu, sou um homem rico, mas amo nossa família. Gosto desta vida modesta que levamos, amo você e as crianças.

Nervosa e trêmula, Soleuza, não mediu palavras: - Como é que pode, você enganando a gente esses anos todos, seu cretino! Você não é homem de verdade! Até TV a cabo você paga pras tuas quengas!

Mauro Agnaldo saiu e voltou depois de duas horas. Trouxe um vestido verde pra Soleuza e um aparelho de TV a cabo debaixo do braço, daqueles piratas que pegam milhares de canais.

Soleuza sorriu. As crianças pularam de alegria.

Sintonizaram na novela das oito e se abraçaram. Viveram felizes para sempre.

Por: Reverendo Lezzagon

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